Dezembro 03, 2020
imsilva
POEMA VIGÉSIMO SÉTIMO
A vida. Com que palavras a dizes ou
a negas? Com que palavras te entregas?
Nasceste do ovo azul da linguagem,
essa que te beijou a pele e beijará teus olhos.
A tua voz é a voz das palavras. Mas já foi
a voz dos frutos e do chão. Das espigas
e das rosas. A que um dia poisou na fala
e se derrama agora na solidão da página.
A vida continua a torturar-te com palavras
acendendo fogueiras, encenando novos
autos de fé, finos rastos de fria dignidade.
É feito de pedacinhos de sílabas o teu rosto.
São restos de poemas, dor que ainda sorri
à luz que acena dentro dos abraços.
JOAQUIM PESSOA, in GUARDAR O FOGO