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pessoas e coisas da vida

pessoas e coisas da vida

Maio 15, 2024

imsilva

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ALICE VIEIRA

O QUE DÓI ÀS AVES 

Às vezes uma palavra bastava
Para que eu soubesse que virias sempre
ao meu encontro

Mas depois chegaram imprevistas tempestades
Que desenharam estranhas perdições
No mapa dos teus dedos

E as palavras que ninguém quis
Silenciaram a festa do meu corpo

E cobriram o teu daquele silêncio imóvel
Dos lençóis que se estendem sobre as casas
Abandonadas no fim do verão



 

Abril 07, 2023

imsilva

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Ontem fui assistir a uma tertúlia com estes dois monumentos da nossa cultura.

Nas comemorações dos 80 anos de trabalho de Ruy de Carvalho, temos Retratos contados. 

Vida e Obra deste grande senhor em conversa com uma sua grande amiga, Alice Vieira, que nos faz desejar ser assim quando formos grandes.

Raciocínio, memória, sentido de humor, projecção de voz e vontade de continuar a trabalhar, foi o que nos transmitiu a todos os que encheram aquele auditório.

Parabéns pelos 96 anos de vida, sabemos que não poderão ser muitos mais, porém, esperamos que sejam com a qualidade demonstrada nesta maravilhosa conversa.

Janeiro 07, 2022

imsilva

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"Sempre amei por palavras muito mais
do que devia

são um perigo
as palavras

quando as soltamos já não há
regresso possível
ninguém pode não dizer o que já disse
apenas esquecer e o esquecimento acredita
é a mais lenta das feridas mortais
espalha-se insidiosamente pelo nosso corpo
e vai cortando a pele como se um barco
nos atravessasse de madrugada

e de repente acordamos um dia
desprevenidos e completamente
indefesos

um perigo
as palavras

mesmo agora
aparentemente tão tranquilas
neste claro momento em que as deixo em desalinho
sacudindo o pó dos velhos dias
sobre a cama em que te espero"

Alice Vieira
in "O que Dói às Aves", Caminho, 2009

(retrato ilustração de Danuta Wojciechowska).

 

Hoje é dia do leitor, nada melhor do que fazer referência a alguém que soube iniciar muitos jovens (e não só) na leitura.     Obrigada Alice. ❤

Novembro 17, 2021

imsilva

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Sucata

o que levam das nossas vidas
as coisas velhas que deitamos fora porque
as casas são pequenas e os objectos
envelhecem agora mais depressa
do que nós

nas velhas casas
os lençóis de linho e as arcas de cânfora
e os serviços de chá onde se via
uma chinesa no fundo das chávenas
que um tio avô
tinha trazido de Cantão
sobreviviam sempre a todos os mortos
e passavam de cama para cama
e de sala para sala
e de mesa para mesa
e eram sempre os mesmos
e nós tão outros

mas agora tudo é feito
para morrer depressa e
sem deixar mágoa nem vestígio

e que fazem dentro das nossas vidas
gravadores de fita máquinas de escrever
cassettes onde aprisionámos
histórias momentos e rostos
que julgávamos eternos
e que pensávamos rever
a vida inteira

--o senhor da sucata estava feliz
agradeceu muitas vezes
enquanto amontoava tudo
deixando a minha casa
subitamente maior

(ou muito mais pequena
conforme o ponto de vista)"

Alice Vieira, Olha-me Como Quem Chove.

Novembro 12, 2020

imsilva

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AS ROMÃS DE NOVEMBRO

abriste a porta e disseste que
toda a casa cheirava a alfazema
enquanto largavas sobre a mesa
as romãs de novembro
e olhaste para as paredes da sala como se
por entre as estantes carregadas de livros
rompessem estevas urzes lilazes
abriste depois a porta do armário
procurando para as romãs um
prato do serviço de vista alegre que
querias sempre à tua espera mesmo que
o jantar se esquecesse no forno
alfazema repetiste
a palavra saboreada com o ar
de quem tinha deixado
o passado inteiro no elevador
e finalmente
encontrado o caminho de damasco
(.....)
*

ALICE VIEIRA, in OLHA-ME COMO QUEM CHOVE-Poesia (D. Quixote, 2018)

 

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