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pessoas e coisas da vida

pessoas e coisas da vida

Maio 01, 2024

imsilva

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Em 1984 embarquei no comboio da vida de casada. Na época a minha mãe era a senhora da casa e do trabalho. Fomos para Espanha em 1965 e o meu pai não quis que a minha mãe trabalhasse. Depois do regresso em 1973, o meu pai não conseguia fazer face às despesas e a minha mãe agarrou vários trabalhos, desde ir de madrugada depenar frangos, até fazer algumas limpezas da parte da tarde, e sempre sem descurar a casa. Era assim, ninguém estranhava. 

Claro, que apesar de ter crescido neste ambiente, nunca achei que era assim que devia de ser. Percebi que assim resultava para eles, mas não teria de resultar para mim. Mas o certo é que no comboio já em andamento as coisas vão tomando o seu caminho conforme as necessidades, e não me custa aceitar que devido a horários e a mais ou menos jeito para as coisas, se vá fazendo um determinado caminho e que vai resultando. 

Mas, a idade traz tudo, até a impaciência e a sensação de injustiça. Quando ninguém olha para o lado para ver mais do que o seu umbigo, a paisagem do comboio começa a cansar, porque eu contínuo a olhar para tudo e a ser a responsável por milhentas coisas que fazem parte da vida de todos. De referir que neste momento estamos 4 pessoas no comboio e duas gatas. 

Hoje, quero saber mais de mim e menos dos outros. Contínuo a trabalhar, apesar de fazer gazeta mais vezes, mas em casa continuam a achar que estou no comando e que tudo corre bem porque eu existo.

Bem sei que se eu não estiver (como há 3 anos atrás) tudo funciona e anda, dessa vez  foi poucochinho tempo, mas toda a gente sabe que tudo se resolve quando assim é preciso. Só que antes de ser necessário todos têm medo.

Tudo isto para dizer que o comboio não descarrila porque é tudo boa gente, se assim não fosse já estava fora da linha há algum tempo. Mas tenho que começar aos gritos e a espumar da boca para ver se se assustam e percebem que estamos todos dentro do comboio e aonde pode nos levar, a mim e a eles. 

Março 17, 2023

imsilva

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Foi numa segunda-feira que foi internada. Na terça disseram-lhe, amanhã. Na quarta, às 8 horas, levaram-na numa maca e ela deixou-se ir, estava nas suas mãos. Era a pessoa que mais importava naquele processo, mas os outros é que mandavam, e ela humildemente acatava as ordens e em silêncio obedecia.

Até que, decidiu contrariar. Queriam dar-lhe a anestesia epídural e ela queria que a pusessem a dormir. Eles insistiam, e ela teimosamente exigia anestesia geral. No fim, foi ela que venceu, e dormiu...

De longe ouviu qualquer coisa, alguém a chamava, e quando ouviu - olhe quem está aqui - fez um tremendo esforço para abrir os olhos, e antes de os deixar cair novamente, ainda teve tempo de ver o seu marido. Foi quando ouviu - está tudo bem, tem uma menina muito bonita -.

E enquanto se sentia em viagem numa maca de hospital, ainda de olhos fechados, ainda a planar algures, a sua alma, o seu coração, o seu ser, sorriam.

Março 15, 2023

imsilva

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Hoje passou-me pela cabeça uns pensamentos que não sei se serão mórbidos,  mas pensei, quantos anos me faltam? O que é que eu quero deixar de mim, que é que eu quero que as pessoas recordem quando pensarem em mim? O que sou como pessoa, como companheira, como mãe, como amiga?

Com todas as turbulências de um ser humano, com todos os quês e porquês da nossa essência, é difícil deixarmos um rasto limpo, bonito e agradável a 100%.

A esperança é termos feito qualquer coisinha bem feita e que a nossa recordação seja em bom, com bons sentimentos a acompanhar.

Mas, enquanto cá estou, convém portar-me bem. Ralhar menos, amar mais, abraçar e mimar os que me rodeiam e esconder o mau humor quando a coisa não corre bem, o que juro que não é fácil.

Entretanto, se eles, as minhas pessoas, se portarem bem (também convém) pode ser que recebam como herança uma chávena, uma caneca, quem sabe uma chaleira?

Será suficiente para se lembrarem bem de mim...?

Junho 29, 2022

imsilva

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Um texto tocante de autor desconhecido.

"QUANDO ME TORNEI INVISÍVEL"

"Já não sei em que datas estamos, nesta casa não há calendários e na minha memória tudo está revolto. As coisas antigas foram desaparecendo.E eu também fui apagando sem que ninguém se desse conta.

Quando a família cresceu, trocaram-me de quarto. Depois, passaram-me para outro menor ainda acompanhada das minhas netas, agora ocupo o anexo, no quintal de trás.

Prometeram-me mudar o vidro partido da janela, mas esqueceram-se. E nas noites, que por ali sopra um ventinho gelado aumentam mais as minhas dores reumáticas.

Um dia à tarde dei conta que a minha voz desapareceu. Quando falo, os meus filhos e netos não me respondem. Conversam sem olhar para mim, como se eu não estivesse com eles. Ás vezes digo algo, acreditando que apreciarão os meus conselhos, mas, não me olham, nem me respondem, então retiro-me para o meu canto, antes de terminar a caneca de café. Faço isso para que compreendam que estou triste e para que me venham procurar e me peçam perdão.
Mas ninguém vem.

No dia seguinte disse lhes:

Quando eu morrer, então sim vocês irão sentir a minha falta.
E meu neto perguntou:
- Estás viva vó? (rindo)

Estive três dias a chorar no meu quarto, até que numa certa manhã, um dos netos entrou para guardar umas coisas velhas. Nem bom dia me deu , foi então que me convenci de que sou invisível.

Uma vez os netos vieram dizer-me que iriamos passear no campo. Fiquei muito feliz, fazia tanto tempo que não saía!
Fui a primeira a levantar, quis arrumar as coisas com calma, afinal nós velhos somos mais lentos, assim arranjei-me a tempo de não atrasá-los. Em pouco tempo, todos entravam e saíam correndo da casa, atirando bolas e brinquedos para o carro. Eu já estava pronta e muito alegre, parei na porta e fiquei à espera. Quando se foram embora, compreendi que eu não estava convidada, talvez porque não cabia no carro.

Senti que o coração encolhia e o queixo tremia, como alguém que tinha vontade de chorar. Eu os entendo, são jovens, riem, sonham, se abraçam, se beijam, mas e eu e eu....

Antes beijava os meus netos, adorava tê-los nos braços, como se fossem meus. E até cantava canções de embalar que tinha esquecido.

Mas um dia...

Um dia a minha neta que acabava de ter um bebê me disse que não era bom que os velhos beijassem os bebês por questões de saúde. Desde então, não me aproximo mais deles, tenho tanto medo de contagia-los!

Eu não tenho magoa deles , eu perdoo a todos, porque que culpa têm eles, de que eu tenha me tornado invisível.

D A

Maio 23, 2022

imsilva

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Eu gostava de acordar em cada dia e ter a minha mãe a meu lado. E o meu pai. E a minha avó. E todas as pessoas de quem gosto.
Mas alguns já se foram embora. Para sempre. E isso deixa-me confuso. Porque para sempre é mesmo muito tempo.
Eu consigo perceber o que é uma hora. Percebo dez minutos. Percebo dez segundos que é uma medida do tempo que uma pessoa começa a dizer e já passou. E percebo um dia ou uma semana. Mas para sempre é tão difícil de perceber...
Um dia, o meu pai foi-se embora para sempre. E eu esqueci-me de lhe dizer uma coisa. Nem sei bem que coisa era. Só sei que esta coisa que eu queria dizer ficou-me entalada na garganta. Para sempre.

José Fanha. In. Diário Inventado de Um Menino Já Crescido.

Ilustração de João Fanha

 

O dia (parte II)

O compromisso

Novembro 05, 2021

imsilva

 

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            O dia (parte I)

A minha filha tem uma aliança nova no dedo.

Um símbolo de uma das escolhas  que temos de fazer na vida. Um compromisso assumido no desejo de uma vida em conjunto, para o bem ou para o mal, na saúde ou na doença, na riqueza ou na pobreza, na alegria ou na tristeza.

No desejo de fazer um caminho acompanhada, de poder agarrar numa mão sempre que necessitar, no desejo de consolar e ser consolada sempre que preciso for. No desejo de partilhar alegrias, orgulhos, preocupações, e a vontade de ajudar os dois seres que deles nasceram, e que ambos querem que sejam felizes para todo o sempre e mais além.

Da minha parte, e com certeza da parte de todos os que os amam, que assim seja. Que o caminho seja o mais direito possível, que os desvios sejam só para admirarem juntos a paisagem por onde passam. Que as pedras que encontrarem sejam para irem construindo  uma fortaleza, e que seja forte para durar até ao fim das suas  vidas. Que os sorrisos e o amor não lhes falte, mesmo nos momentos menos bons, pois serão uma ajuda preciosa para levantarem os muros que caírem. 

Por favor, sejam felizes e aproveitem tudo o que a vida vos pode oferecer.

 

Janeiro 25, 2021

imsilva

Ontem, a minha irmã recebeu o resultado de um teste, e foi positivo. Não está grávida, tem COVID19. Está bem, alguns sintomas ligeiros.

Ontem, saí de casa e fui votar. Votei sempre e nunca apanhei tanta gente a fazê-lo. Não entendo o porquê, porque a votação dentro das salas foi feita com rapidez, mas as filas eram enormes.

Ontem fui a casa dos meus pais, não ia há duas semanas, mas fui com os devidos cuidados, e através do telemóvel fiz vídeo chamadas para verem que a filha mais velha estava bem, e para se poderem despedir do neto (pelo telemóvel) que hoje foi para fora.

Ontem fiz o serão da praxe em noite de eleições, ouvi os discursos dos candidatos na televisão e sem grandes surpresas, para além das que já se esperavam...fiquei na mesma.

Hoje, despedi-me do meu filho que foi novamente para fora.

Hoje, preparo-me para juntamente com toda a família, cantarmos os parabéns ao meu pai à distância. Alguém irá com um tablet para nos ligar-mos todos e assim podermos por primeira vez, não estarmos presentes, mas celebrarmos de alguma maneira mais um ano.

Hoje, vou continuar em confinamento, em casa, com a ansiedade a espreitar e eu a fazer que não percebo.

Amanhã, vamos juntar a família num al moço que durará até à noite, e acabará com a canja da avó, antes de irmos para casa.  Riremos e faremos a confusão inerente à ocasião, como sempre.

Amanhã, juntar-me-ei com os meus amigos, darei beijos e abraços sem máscaras nem medos, sem empecilhos, só com amor e amizade.

Tal como ontem e hoje, amanhã nascerá o sol, e com uma esperança teimosa, espero que seja para todos.

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Ontem, hoje e amanhã, sinto-me pendurada...

Janeiro 09, 2021

imsilva

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Como é que um ano tão novinho pode já estar a fazer tanta porcaria???

Foi ao supermercado e encheu um carrinho com acepipes e tudo o que seria necessário para um fim de semana em família.

Estariam os 3 filhos e os netos em casa, teria que ser nesse fim de semana, pois um deles regressaria a casa noutro país, e uma vez que iriam ser 2 dias de confinamento em que ninguém iria trabalhar, iria ser para aproveitar ao máximo.

Mas...As coisas nem sempre são como gostaríamos, não é?

O namorado de uma das filhas é internado com suspeitas de COVID,  ou seja, uma baixa, porque essa filha já não vai lá para casa. O filho esteve com um amigo que acabou de saber que está positivo. E a filha que acabou de chegar com os netos, decide voltar para casa, porque o seu trabalho é com pessoas de idade e não quer dar hipótese de levar o bicho até aos seus utentes.

Chora a filha quando vai embora, chora o neto a quem disseram que ia passar uns belos dias com os avós e os tios, e chora a avó , porque os envolvimentos são muitos, e sente que lhe estão a comandar a vida, completamente.

E agora, quando poderão  reunir-se todos outra vez???

Ninguém merece!

Maio 02, 2020

imsilva

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Sairam os quatro do edificio.

 Já está - disse o pai 

Está feito  - disse a mãe                                                                         

Tinham acabado de casar. Depois de 14 anos de união, e de dois incriveis filhos, eram marido e mulher.

Olharam para as duas crianças com amor, e para comemorar tiraram uma selfie um tanto ou quanto bizarra, por terem as bocas e os narizes tapados por máscaras. O edificio do Registo Civil ficou por detrás, qual muda testemunha.

Vamos para casa?

Os rapazinhos não estranharam, já estavam a ficar habituados ao confinamento. Aquele dia não iria ser muito diferente. Em vez de irem festejar com a família, ou irem comer a algum sítio todos juntos, iriam para casa.

Mas o que é a nossa casa senão o nosso casulo, o sítio onde está o amor, o conforto e a felicidade?

Haveria tempo para celebrações, muito tempo... 

 

 

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